Cama de Gato


Mais uma discussão entre mamãe e eu. Sendo forçados a vivermos juntos - pelo menos provisoriamente - é verdade que esse período tem se prolongado bem mais do que eu gostaria, mas, como costuma falar minha colega Narjara Turetta, se la vi - é como se eu tivesse caído numa cama de gato. Por sorte, o trabalho tem me consumido a ponto de eu chegar em casa tão cansado que quando ela parte para o ataque eu recuo, ultimamente tem sido a melhor tática: recuar. Dessa vez o problema foi o pote de sorvete que desapareceu do congelador do quarto dela e que ela sabe que fui eu quem pegou. Reconheço que errei, mas sorvete é para mim o melhor - se não o único - remédio para ressaca e, na última que enfrentei não me restou outra escolha, entrei na calada da noite no quarto enquanto ela dormia e afanei o pote de sorvete de creme com passas. Minutos depois eu já estava quase curado, mas no dia seguinte, que foi ontem, eu tive que ouvir. Dessa vez foi impossível recuar. Ela tocou em um ponto que ela sabe que não deve tocar e que me faz perder a cabeça: o meu pai, que nos abandonou quando eu ainda era um bebê. Acabei falando para ela que eu tinha era inveja dele, que teve a sorte de livrar-se dela. Blá, blá, blá, ofensas de ambas as partes, e o gran finale com ela aos prantos interpretando a vítima, com lenço na testa e tudo. A pensão toda escutando do lado de fora - a discussão ocorreu no local do crime. Acho que mamãe está começando a se repetir nos gestos e falas, eu já sei qual gesto vem depois do outro, o que ela fala sou capaz de acompanhar sussurrando, mas também, esse tipo de cena dramática vem se repetindo rotineiramente nos últimos 4 meses. Daqui a pouco eu escrevo um livro, ou melhor, uma peça de teatro, quem sabe ela gosta e resolve interpretar a si mesma, saindo numa longa turnê. É, preciso começar a escrever já! Sugestões para o título?

Nenhum comentário: